04 setembro 2007

A plenitude (sexual) de uma mulher madura.

Nas horas vagas ela é política e só agora se apercebeu que o tempo gasto no doutoramento sobre um qualquer ramo da filosofia era apenas a sua vontade aprisionada de querer aprender a viver simultaneamente com o corpo e a alma.

Para isso buscou mestras e mestres que a levaram de cama em cama, da cama à secretária e, em certos casos, converteu a sua secretária em cama.


As reflexões teológicas sobre a guerra dos sexos ficaram perdidas quando lhe chamavam trintona e agora misturam-se com o adestramento sensual e todas as lições desembocam como conclusão em que a razão só serve para dar a conhecer ao seu homem qual é o grau de vontade que tem de fazer ou de evitar esta ou aquela coisa, combinado com o prazer ou desprazer que pode advir-lhe por fazê-la …

Através da experiência do bom senso, definiu placidamente a voluptuosidade da sua sensualidade como a tranquilidade do espírito combinada com a saúde do corpo, que se apresenta como uma mulher inteligente e refinada que pensa para se livrar do assédio daqueles que pretendem amargurar-lhe os prazeres da vida com superstições.


Já se convenceu do poder corrosivo da idade no impacto da sua beleza exterior e não quer edificar outro mundo, mas sim impedir que outras amigas, com manias sistematicamente paranóicas, com quem partilha, por vezes, os seus sentimentos mais íntimos, turvem os seus prazeres recônditos.

É um ser intelectual que conta com toda a minha simpatia, apesar das suas limitações.

Já não vive num tempo em que as pessoas tinham em matéria sexual opiniões tão pacatas e penitencialmente contidas como as do pior pároco da aldeia mais situada no interior de um país que teima em continuar perdido à deriva, simplesmente porque se esqueceu que tal realidade alguma vez sequer existiu um dia.

A originalidade do seu ser delicado e sensível foi nunca ter negado a sua natureza feminina porque todos os dias sou uma testemunha observadora do modo de pentear cuidadoso dos seus bonitos cabelos ondulados de cor castanha doirada, uma cor só vista nos raios de luz efervescente da manhã que tocam delicadamente os móveis de pinho claro da herdade alentejana.

A felicidade do seu paladar transborda em pratos variados, próprios para contentar com sensualidade essa pluralidade de apetites femininos.

Não há natureza masculina que resista à sua presença, e as exigências da necessidade material que paira no cheiro do quarto constituem o código fisiológico que deve ser satisfeito não com simples resignação desculpabilizada, mas com piedoso júbilo inocente e com devota imaginação hedonista.

Ela faz parte de uma elite tão discreta, como bem informada, que consegue, cada vez mais, escapar clandestinamente à influência dos indomáveis desejos sensuais que surgem em jantares românticos que misturam negócios estrategicamente comprometedores para um qualquer país que goste de se sentir pequeno face à sua ambição de amar.

Aparentemente ela sabe transparecer a ideia que consegue proibir o prazer não revelando exteriormente que tal proibição é a chave que a estimula: A luz vermelha só se acende dentro dela quando os seus desejos começam a atravessar a rua da volúpia.

Ninguém lhe faz falta para legitimar as apetências porque tem capacidade para dissimular e conter qualquer delírio de uma rebelião feminina interior sensual, o que lhe permite fingir para as pessoas que a rodeiam que se opõe frontalmente ao pensamento libertino, tentação somente revelada em conversas íntimas com as suas amigas mais próximas de conjugarem dos mesmos pecados que se fizeram propositadamente para se quebrarem por mulheres corajosamente atrevidas.

Esta mulher moderna tem presente que a proibição que povoava as mentes das suas sucessoras era um obstáculo que vedava o regresso ao paraíso divinamente natural, convertendo-se depois na porta de acesso ao paraíso sempre artificial e monótono.

Os seus amantes são meros homens que gosta de manipular, controlar, gozar, testar, dar um estalo de sadismo infantil, fazendo com que estes sejam insignificantes transgressores de paraísos artificiais românticos embebidos de raivosa nostalgia em relação a uma inatingível natureza originária aniquilada pelos usos predatórios da modernidade.

Ela desfruta secretamente de uma vida oculta baseada numa personalidade que é convidada para violar as proibições burguesas estabelecidas nas festas maçónicas para as quais recebe convite em papel papiro egipcío com códigos indecifráveis sobre o local da realização de cada um destes eventos mágicos e únicos onde se liberta de todos os tabus que a carreira profissional lhe suga durante o dia.

Ao levantar a proibição sem a suprimir transforma o erotismo numa arma poderosa de atracção sobre os homens mais influentes da sociedade executiva.

Por contradição à sua aparência, ela é a guardiã e indicadora do desejo pecaminoso que proíbe na sua faceta laboriosa e fora do pecaminoso, o desejo carece de incentivos e de orientação sensual de um parceiro que corresponda a altos parâmetros de exigência para o correspondente companheirismo.

As espontaneidades corporais que associa à humilhante e redimida condição masculina fê-la promulgar a lei de que na sua carne não mora o bem e que o mal está dentro dela.

Mas, enquanto vive, as palavras podem calá-la nos seus discursos mais sérios, mas no pensamento cresce e cresce a vontade de ser abraçada pelos braços vigorosos do seu amado.

Ridícula mas transtornadora vida paralela, ela não se apercebe, na verdade, que a única satisfação possível reside em livrar-se de algo que lhe sobra, não em conseguir algo que lhe falta.

Daqui nasce a ilusão de que as carícias, os gulosos olhares, os mais apertados abraços, permitem apoderar-se da beleza alheia ou fundir duradouramente o corpo desejado com o do homem que a deseja fervorosamente.

Os membros entrelaçados dissolvem-se na convulsão do prazer, mas depressa volta a mesma loucura, o mesmo frenesim, e luta por conseguir o objecto das suas ânsias, sem poder descobrir o artifício que vençe o seu mal e que em profundo desconcerto, sucumbe à sua chaga secreta de ser amada.

A sexualidade e a morte não são mais que os momentos agudos de uma festa que a natureza celebra com a massa inesgotável dos seres, uma e outra têm esse sentido de ilimitado esbanjamento com o que a natureza age, contra o desejo de durar que é próprio de cada ser.

A negra irmandade de um anel constituído por uma liga de sexualidade e mortalidade permanecerá para a eternidade um dado oculto, talvez para não desanimar os amantes na sua tarefa de consumação, mas entre os seus amantes, ela faz questão de a ensinar com o objectivo de observar os gozadores vulgares que preferem transitoriamente pô-la de lado quando sobem para a sua cama de prazeres.

O sexo fica aturdido quanto à sua relação com a morte ou procura alegação na reprodução para a resolver satisfatoriamente (Ela acredita na ilusão de que poderá viver nos seus filhos, e o que certificará a sua morte prolongará a vida na geração vindoura!), enquanto que o erotismo que exala da sua pele a olha de frente através dos olhares cobiçosos de homens navegadores e até obtém prazer dela.

Esta mulher erótica não se confunde com a mera resignação de outras mulheres formatadas para a rotina citadina, e encarna a astúcia da vontade de viver.

Uma vez desaparecida a complexidade do mundo exterior, é possível a esta mulher um dia compreender o fundo do seu ser feminino, a simplicidade do ser.

O autor do blog

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