22 junho 2008

Nunca existiu, não existe, nem haverá uma política de combate à pobreza, de segurança, protecção, reintegração e solidariedade social neste país …

… o que existe (ontem, hoje e amanhã) são apenas migalhas lançadas à miséria e o total esquecimento de um povo que se resignou a sofrer e a não esperar nada da classe política que não tem valor nenhum …

Todas as políticas, dirigentes e funcionárias que integram o sistema público de segurança social não querem saber absolutamente nada da pobreza que existe e que cada vez mais se multiplica pelas ruas deste país.

Assim só me resta atribuir a todas as responsáveis políticas por estas situações de pobreza acontecerem e se perpetuarem no tempo desta nação que deambula ao sabor do maré e do infortúnio, o seguinte prémio de falsidade e dureza reflectora desta vida:


Inspirações:

O Balneário Grande - Reportagem distinguida com o 1º Prémio no Festival Internacional de televisão de Montecarlo, 1º Prémio AMI – Jornalismo contra a indiferença e menção honrosa no prémio de jornalismo da Associação Nacional de Municípios Portugueses.

O que dizem de uma cidade os seus balneários públicos?

Que histórias se cruzam sob os duches gratuitos da capital?

A primeira vez que tomou banho no balneário público de Alcântara, Guilhermina Rodrigues era menina. Oito anos. Menina de ser levada ao balneário pela mão dos pais, ainda que já trabalhasse "na venda", ofício que manteve até à idade da reforma.

Mais tarde Guilhermina levou os filhos, depois os netos. Guilhermina Rodrigues, lisboeta de Alcântara, nunca teve casa de banho. Como tantos dos que frequentam o balneário de Alcântara.

Desde que ficou viúva, Guilhermina não vai ao balneário público apenas pelo duche quente. A companhia de Rosa e dos outros ajuda a encher-lhe os dias, que terminam cedo, à janela, "a ver passar os eléctricos e os da ponte".

Como tantos dos que frequentam o balneário de Alcântara, Aníbal José da Costa Jorge vive na rua.

Andou embarcado 25 anos, há mais de dez que é um barco à deriva.

Como muitos dos que aquecem o corpo envelhecido e pouco mimado sob os chuveiros públicos da capital, Amélia Oliveira vive sozinha. Os olhos doces de Amélia passeiam pelo balneário todos as manhãs da semana. A câmara deu-lhe uma casa em 2005. Tinha então 85 anos e, pela primeira vez, uma casa de banho. Mas a banheira "é um luxo" de que Amélia já não consegue desfrutar sem ajuda. No balneário, onde vai todos os dias "para distrair" e à sexta-feira para tomar banho, tem as promessas de casamento de Vítor e a ajuda de Rosa. "Só para lavar as costas, ainda me lavo sozinha!".

Que velhice esperará Paulo Silva, que tem 33 anos e arruma carros em Lisboa?

Nos últimos anos, lamenta Vítor Cruz, "tem piorado. Isto nos último dois anos tem piorado e muito, e muito." Vítor é o vigilante. É ele quem vai ao posto marcar consultas, quem preenche o IRS e quem lê as cartas às viúvas, porque "99 por cento das velhotas que aqui vêm não sabem ler". É também ele quem lhes telefona aos filhos, emigrados em França, quando elas não ouvem. Não têm mais ninguém a quem se queixar da solidão. (Entre os que não têm casa de banho, os que vivem na rua, e os que envelheceram sozinhos, aqui se constrói uma certa rede familiar, com as respectivas avenças e desavenças.)

Só na freguesia de Alcântara há pelo menos 400 casas sem casa de banho. "Nunca esperei", diz José Godinho, presidente da Junta. José Godinho conheceu o balneário em tempos de miséria maior. "Vi coisas que nunca pensei que existissem em Portugal. Pessoas a viver em cavernas autênticas e muita gente sem casa de banho. Nunca esperei. Ainda há dias disse a um amigo que tínhamos feito uma casa de banho a uma senhora de 86 anos, que toda a vida se lavou num alguidar. E ninguém acredita".

O balneário de Alcântara é o único gratuito e o mais frequentado dos 22 balneários públicos de Lisboa. Recebe mais de 500 pessoas por semana.

"O Balneário" é a Grande Reportagem SIC deste Domingo.

Miriam Alves

Jornalista

Reportagem: Miriam Alves e Filipe Ferreira (Imagem)

Edição de Imagem: Ricardo Tenreiro

Pós-produção Áudio: Pedro Miguel Carvalho

Grafismo: Patrícia Reis

Produção: Isabel Mendonça e João Nuno Assunção

Coordenação: Daniel Cruzeiro

Direcção: Alcides Vieira

Publicação: 20-06-2008 18:48

Última actualização: 22-06-2008 18:17

Grande Reportagem SIC

http://sic.aeiou.pt/online/noticias/programas/reportagem+sic/Artigos/O+Balne%C3%A1rio.htm





Balneário público de Alcântara fornece quinhentos banhos gratuitos por semana.

Em pleno 2007, tomar banho é ainda um "luxo" para muitas pessoas em Lisboa, residentes ou sem-abrigo, que encontram no balneário público de Alcântara, além de duche diário e roupa lavada, apoio e companhia nas horas de solidão. Os ‘banhos' recebem um grande número de pessoas com diferentes necessidades que sabem que em Alcântara há um lugar solidário para com todos.

Construído na década de 30, durante o Estado Novo, o balneário público de Alcântara fornece actualmente uma média semanal de quinhentos banhos gratuitos, trezentos a homens e cento e setenta a mulheres, sendo que a maioria dos utilizadores deste serviço são pessoas sem-abrigo.

A maior parte dos utentes não reside na freguesia - 60 por cento -, seguindo-se os residentes em Alcântara - 40 por cento - e alguns estrangeiros - 10 por cento.

Pessoas.

Aos 84 anos, Amarilis, uma moradora da Picheleira, já não se lembra há quanto tempo associou o ritual do banho no balneário da Rua Padre Adriano Botelho ao seu quotidiano, sabe apenas que foi há muitos anos. "Tenho condições para tomar banho em casa, mas o duche daqui é melhor", disse esta utente em declarações à agência Lusa, deixando perceber que além do banho, quer é "limpar" parte da solidão que lhe preenche os dias.

É por isso que, "sempre que pode", atravessa meia Lisboa para tomar ba-nho com a ajuda da Dona Rosa, a res-ponsável pela área do balneário reservada às mulheres, que é para Amarilis uma "espécie de enfermeira particular" que lhe lava as costas e a ajuda a vestir-se. "A seguir vou ao cabeleireiro", diz, ciosa da importância de ter uma imagem cuidada.

Situado no terceiro piso do edifício, o balneário feminino é frequentado principalmente por "raparigas da rua e pessoas idosas que ou não têm condições para se lavar ou precisam de ajuda", explicou a Dona Rosa, de 63 anos, mais de 14 dos quais a trabalhar no balneário.

Números.

Durante a semana, estas instalações - que funcionam diariamente das 7:00 às 13:00 horas - recebem uma média de trinta mulheres, sendo que ao fim-de-semana o número aumenta para cerca de cento e cinquenta banhos femininos.

O mesmo aumento verifica-se no número de banhos masculinos, que durante a semana são cerca de quarenta e cinco e ao fim-de-semana sobem para cerca de duzentos e trinta a duzentos e quarenta.

"Na maioria são sem-abrigo que chegam também de outros concelhos como a Amadora, Oeiras e Almada", disse à agência Lusa Vítor Cruz, de 61 anos, que há 8 "gere" a área masculina do balneário e a lavandaria social. "Mais de sessenta por cento das pessoas que aqui vêm não trazem toalha nem sabão e verificámos que, por vezes, se lavavam e depois vestiam a roupa suja. Foi assim que nasceu a lavandaria social que funciona com roupa dada ao balneário, que depois a distribui pelos utentes", explicou Vítor Cruz.

Com recurso a um simples sistema de "papelinhos" que só ele percebe, Vítor Cruz recebe, lava, passa a ferro e separa a roupa que lhe chega, tanto a proveniente dos donativos como a dos próprios utentes e assegura-se que todos saem do balneário com roupa limpa e apresentável.

Necessidades.

Mário Mateus, de 34 anos, vive na rua e "pára ali para os lados do Estoril", mas é a Lisboa que vem "quase todos os dias" para tomar banho e trocar de roupa.

Com o corpo marcado por anos de consumo de drogas, Mário recusa desleixar-se na higiene pessoal. "Não é por vivermos na rua que temos que ser porcos", disse Mário à agência Lusa, considerando "essencial" para os sem-abrigo um serviço como este, que funciona também muitas vezes como armazém.

"Como não têm onde deixar as coisas, deixam-nas aqui e depois vêm buscá-las", referiu Vítor Cruz, que não consegue dei-xar de se envolver pela má sorte desta gente. "Às vezes a miséria é tanta que tiro do meu bolso para dar a quem me aparece aqui. Compro sempre pão para levar para casa, mas a maior parte das vezes não chega lá, fica por aqui. Há muita miséria, cada vez mais e aparecem aqui sobretudo muitas pessoas sozinhas", lamenta, adian-tando que ultimamente até aparece no balneário gente a pedir mercearias e comida.

Solidariedade.

O presidente da Junta de Freguesia de Alcântara, José Godinho, que desde 1982 lidera a autarquia, não esconde a "mágoa" que lhe causa saber que nas zonas mais antigas de Alcântara e do Alto de Santo Amaro ainda há muita gente com casas sem condições para tomar banho. "Gastámos cerca de 30 mil contos (dados avançados pela autarquia) para construir instalações sanitárias nas casas das pessoas, mas desde que o Santana Lopes esteve na Câmara que não recebemos nada", disse José Godinho, lamentando que ainda haja gente que não tem uma coisa "tão primária" como habitação com casa de banho.

O balneário público de Alcântara pertence à Câmara Municipal de Lisboa, que assegura parte das despesas de funcionamento e manutenção, e a sua gestão está a cargo da Junta de Freguesia de Alcântara, que tem vindo a fazer melhorias, designadamente com a instalação de cabinas especiais para deficientes e pessoas obesas.

Melhoramentos que não satisfazem completamente José Godinho, que quer também substituir a caldeira, que ainda funciona a gasóleo, e revestir os balneários com azulejos.

Mas nem todos os que chegam ao balneário o fazem por falta de lugar para tomar banho em casa.

Há lugar para todos.

Carlos Pinto, de 52 anos, empregado de armazém e a residir na zona da Avenida Duque de Loulé, vai diariamente a Alcântara para tomar banho porque há um ano que está de baixa e não conse-gue pagar as contas da água e do gás. "Apesar de ter condições em casa para tomar banho, a baixa leva-me o rendimento quase todo e não tenho dinheiro. Venho por pobreza e necessidade e apesar de ser um balneário público consigo ter privacidade", testemunhou à agência Lusa.

Também José Godinho garante que já viu sair uma família inteira de dentro de um BMW para ir ao balneário. "Não se pode falar em pobreza escondida porque quem tem um BMW não é pobre, mas é uma pobreza envergonhada", sustentou.

Terça-Feira, 23 Outubro de 2007

http://www.mundoportugues.org/content/1/1411/balneario-publico-alcntara-fornece-quinhentos-banhos-gratuitos-por-semana/

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