A redacção do seguinte Currículum Vitae (CV) foi escrita por um candidato numa selecção de pessoal numa multinacional muito conhecida na área automóvel que fabrica carros com a mão-de-obra muito barata que existe no meu país, mas que depois os vende a um preço extremamente elevado e impossível de suportar (mesmo com empréstimo bancário) a apenas algumas pessoas de nacionalidade desse mesmo país.
No anúncio de abertura da vaga a ocupar naquela multinacional era exigido aos candidatos que demonstrassem possuir experiência profissional na área para a qual o recrutamento estava a ser feito.
O final feliz deste CV é que o candidato foi aceite, pela sua criatividade e sensibilidade humana que é facilmente compreensível na sinceridade das palavras depositadas no seu texto.
O final triste do CV é que a multinacional continua a vender carros caríssimos que um dia gostava de saber como é que possível a uma pessoa honesta e trabalhadora como eu ter condições, sequer, para comprar a gama mais baixa de um daqueles carros.
TEXTO DO CV:
Já fiz cócegas à minha irmã só para que deixasse de chorar, já me queimei a
brincar com uma vela, já fiz um balão com a pastilha que se me colou na cara
toda, já falei com o espelho, já fingi ser bruxo.
Já quis ser astronauta, violinista, mago, caçador e trapezista; já me
escondi atrás da cortina e deixei esquecidos os pés de fora.
Já roubei um beijo, confundi os sentimentos, tomei um caminho errado e ainda
sigo caminhando pelo desconhecido.
Já raspei o fundo da panela onde se cozinhou o creme, já me cortei ao
barbear-me muito apressado e chorei ao escutar determinada música no
autocarro.
Já tentei esquecer algumas pessoas e descobri que são as mais difíceis de
esquecer.
Já subi às escondidas até ao terraço para agarrar estrelas, já subi
a uma árvore para roubar fruta, já caí por uma escada.
Já fiz juramentos eternos, escrevi no muro da escola e chorei sozinho
na casa de banho por algo que me aconteceu; já fugi de minha casa
para sempre e voltei no instante seguinte.
Já corri para não deixar alguém a chorar, já fiquei só no meio de mil
pessoas, sentindo a falta de uma única.
Já vi o pôr-do-sol mudar do rosado ao alaranjado, já mergulhei na
piscina e não quis sair mais, já tomei whisky até sentir os lábios
dormentes, já olhei a cidade de cima e nem mesmo assim encontrei o
meu lugar.
Já senti medo da escuridão, já tremi de nervos, já quase morri de
amor e renasci novamente para ver o sorriso de alguém especial.
Já acordei no meio da noite e senti medo de me levantar.
Já apostei a correr descalço pela rua, gritei de felicidade, roubei
rosas num enorme jardim, já me apaixonei e pensei que era para
sempre, mas era um 'para sempre' pela metade.
Já me deitei na relva até de madrugada e vi o sol substituir a lua; já
chorei por ver amigos partir e depois descobri que chegaram outros novos e
que a vida é um ir e vir permanente.
Foram tantas as coisas que fiz, tantos os momentos fotografados pela lente
da emoção e guardados nesse baú chamado coração...
Agora, um questionário pergunta-me, grita-me desde o papel:
- Qual é a sua experiência?
Essa pergunta fez eco no meu cérebro. Experiência....
Experiência... Será que cultivar sorrisos é experiência?
Agora... agradar-me-ia perguntar a quem redigiu o questionário:
- Experiência?! Quem a tem, se a cada momento tudo se renova ???
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